Livros são importantes para a sociedade, seja para educar, informar ou entreter. No Brasil, o setor editorial é protegido de cobranças de impostos desde 2004, através da Lei 10.865/04.
A retirada de tributos alivia um pouco o preço de um produto que, no Brasil, não pode ser considerado barato. Há países em que outros incentivos reduzem o preço e aumentam a leitura. Mas agora até a retirada da tributação está sendo ameaçada e os livros podem subir de preço.
Em julho, a reforma tributária do ministro da economia, Paulo Guedes, propôs que os livros estariam sujeitos a uma alíquota de 12%, encarecendo a produção e o produto final. O argumento do ministro foi de que o livro é um produto consumido apenas pelas elites. Além de aumentar a lógica da exclusão, a tributação dos livros pode ser prejudicial a todo mercado editorial brasileiro e, principalmente, dificultar o acesso à educação e ao lazer.
O Fato&Versão conversou com duas editoras independentes, a Se Liga Editorial e Editora Lettre, que possuem suas próprias perspectivas e experiências, para entender como uma futura taxação de livros pode prejudicar o mercado editorial independente e seus leitores.
Quais são as maiores diferenças entre uma editora independente e uma editora tradicional?
Thati Machado (Se Liga): Grandes editoras tradicionais contam com um capital muito maior, o que permite uma equipe grande onde cada um desempenha uma função; lançamentos com grandes campanhas de marketing e divulgação; distribuição em nível nacional, entre tantas outras coisas. Uma editora independente, muitas vezes, conta com uma equipe reduzida que precisa se dividir entre todas as atividades editoriais.
Quais os maiores desafios em gerir uma editora independente?
Tatiana Iegoroff (Editora Lettre): Para nós, há dois grandes desafios: fazer com que as pessoas nos conheçam e confiem em nós e, consequentemente, a questão da venda de nossos livros. Sabemos como ainda há muito preconceito com a literatura nacional e, por isso, autores desconhecidos publicados por editoras desconhecidas são muito desacreditados.
Nos últimos anos houve um aumento de editoras independentes no Brasil. Você acredita que isso é reflexo do também aumento de autores e autoras no país?
Thati Machado (Se Liga): Em parte, sim. Mas não apenas isso. Acredito que muitos autores se frustram no processo de publicação com as grandes editoras, especialmente porque elas, por muito tempo, não olharam para a diversidade ou para as evoluções da sociedade. Com isso, surgiu-se a necessidade de pensar outras formas de publicação: independente, coparticipação, financiamento coletivo.
A ascensão dos ebook e leitores digitais como o Kindle é um ponto positivo para uma editora independente?
Tatiana Iegoroff (Editora Lettre): Confesso que ainda não vemos muita vantagem nesse mercado, pois os leitores esperam preços mais baixos para os ebooks, e como ebooks costumam ser vendidos pela Amazon, outro problema é a porcentagem que a empresa retém para si. Ou seja, ebooks não nos dão um retorno muito expressivo, mas investimos neles como uma forma de divulgação do nosso trabalho.
Thati Machado (Se Liga): Sem sombra de dúvida. Os ebooks nos permitem alcançar leitores em qualquer canto do mundo. O custo de produção é menor e não há limites físicos para ele. Grande parte da renda do Se Liga vem justamente dos livros digitais.
Segundo pesquisas, o brasileiro lê em média 2,43 livros por ano. Você acha que isso está mudando ou em vias de mudar?
Thati Machado (Se Liga): Enquanto o acesso ao livro não for democrático e uma preocupação governamental, acredito que não. Aqueles que de fato são leitores consomem muito mais títulos por ano, mas essa não é a realidade da maior parte da população. O livro ainda é de difícil acesso ou um item considerado “de luxo” em nosso país.
Qual seria o impacto para uma editora independente caso a taxação seja aceita?
Tatiana Iegoroff (Editora Lettre): A taxação de livros irá reduzir ainda mais o nosso público leitor. Isso porque teremos de considerar mais esse imposto na hora de orçarmos os nossos livros e esse valor acabará sendo pago ou pelo autor ou pelos próprios leitores. Se o autor tiver de arcar com esse valor, mais autores se sentirão desmotivados a publicar, pois sabemos que já é um preço alto para muitos. Por outro lado, se o leitor arcar com esse custo, significa que o preço do livro em si será mais alto e se hoje em dia já vemos tantas reclamações de que “livro no Brasil é caro”, imagina se tivemos de subir ainda mais os preços. Obviamente, a taxação de livros nos coloca em uma via sem saída, que muito provavelmente culminará na falência de muitas editoras independentes.
Thati Machado (Se Liga): Nós trabalhamos com pouquíssimos recursos. Muitas vezes, precisamos tirar leite de pedra. Com a taxação proposta, de 20%, precisaríamos repassar essa conta para o consumidor final, nosso leitor. Produzindo livros em pequenas quantidades, como é o nosso caso, pagamos caro em cada unidade e com mais impostos a conta simplesmente não fecharia.
A situação do mercado editorial já não está tão boa. Como exemplo, temos grandes livrarias como a Saraiva fechando as portas, deixando muitas editoras no prejuízo. Você acredita que a taxação de livros aceleraria esse processo?
Thati Machado (Se Liga): Acredito que o único intuito da taxação de livros é dificultar, ainda mais, o acesso à educação. Um povo que não lê está fadado a aceitar qualquer coisa que lhe for imposta, sem questionamentos.
Só verdades nessa entrevista. Espero muito que essa taxação nãos eja aprovada
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